De todos ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, acredito que a fé e o perdão (principalmente por assassinato de entes queridos), devam ser os mais difíceis de se praticar. Todavia, possivelmente para todos nós humanos, o perdão não é uma tarefa fácil. Nesse momento, me veio na memória uma frase de um amigo no dia do assassinato do seu filho: “Pimenta nos olhos dos outros é refresco”. Apenas substitui o termo chulo. O ditado popular quer dizer que o sofrimento alheio não dói na gente, que é fácil falar quando o problema é com outra pessoa.
No caso específico de ter “Fé”, entendo que todos tenhamos, nem que seja do tamanho de um grão de mostarda. Sobre esse aspecto, compartilho com o que o escritor potiguar Antônio Barnabé Filho, escreveu no seu livro “Buscai o Espírito Santo”: “Nossa fé pode ser comparada à construção de uma torre de concreto: começa o alicerce e, aos poucos e lentamente, vão crescendo tijolo a tijolo. A diferença é que na construção da fé parece que venta muito ou falta matéria-prima”.
Não podemos esquecer que ter fé é crer firmemente em algo, sem ter em mãos nenhuma evidência de que seja verdadeiro ou real o objeto da crença. É a energia que alimenta todas as crenças e religiões do planeta, desde os primórdios da humanidade. Jesus, em seus ensinamentos, teóricos e práticos, demonstrou integralmente a importância da fé, e o seu potencial inquestionável.
Os próprios apóstolos, seguidores de Jesus, sofriam com a falta de fé. Lembrando do Evangelho de Mateus (8, 23-26): “E, entrando ele no barco, seus discípulos o seguiram; E eis que no mar se levantou uma tempestade, tão grande que o barco era coberto pelas ondas; ele, porém, estava dormindo. E os seus discípulos, aproximando-se, o despertaram, dizendo: Senhor, salva-nos! que perecemos. E ele disse-lhes: Por que temeis, homens de pouca fé? Então, levantando-se, repreendeu os ventos e o mar, e seguiu-se uma grande bonança”.
Não temos como não exaltar a grandeza da fé do povo do sertão nordestino. Seja na abundância da chuva ou na escassez da seca, o sertanejo não muda sua fé. A fé, por estas bandas, resiste a muito mais do que pequenas provações diárias: Resiste à fome, à sede, à tristeza de ver o rebanho morto. Mas, provavelmente, boa parte do Brasil tem ao menos uma gota do sangue nordestino. Sangue devoto.
Quanto ao perdão, repito, não é tarefa fácil e nunca foi. Por isso começamos escrever sobre o perdão lembrando que nós erramos o tempo inteiro, mas não aceitamos que errem conosco. Na verdade, fazemos dos erros dos outros uma justificativa para os nossos próprios.
Desde pequeno, temos vivido sistematicamente sob o princípio de que é preciso ser perfeito e nunca falhar, porque quem falha merece ser punido, repreendido e condenado, mas isso é exatamente o que não queremos para nós mesmos.
Já ouvi inúmeras histórias, de como fulano ou sicrano não perdoariam a ação dos outros. Mas sempre me pergunto, será que há algo que é inerentemente imperdoável? Em muitas circunstâncias, aquilo que tem um peso muito grande para você, pode ser pequeno para o outro e, às vezes, até insignificante. Traição, morte, dor, dor, injustiça, incompetência, falta de ética, perda de dinheiro, mentira, crueldade? Todo mundo tem uma lista negra. Muitas pessoas assumem claramente as suas dores e mágoas, abraçam seus ressentimentos e terminam reiterando sua incapacidade de oferecer perdão aos seus algozes. Tem pessoas que cultivam mágoas como alguém cultiva um jardim. “Não tenho como perdoar o que ele me fez”; “Ninguém nunca passou pelo o que eu passei”; “Eu quero perdoar, mas não consigo”; “Ele foi muito cruel comigo, então, tem que pagar por isso”; “Passe o tempo que passar, eu nunca vou me esquecer do que aconteceu”. Um verdadeiro círculo vicioso: relembrar a mágoa, ressentir a dor e voltar ao desejo de vingança.
Relembramos do atentado que São João Paulo II sofreu em 13 de maio de 1981, e poucos dias depois mostrou ao mundo a força do perdão. Quatro dias após o atentado, João Paulo II, por meio de uma gravação feita no leito do hospital, com voz fraca, disse: “Rezo pelo irmão que me atirou, a quem eu sinceramente perdoei. Unidos a Cristo, Sacerdote e Vítima, eu ofereço meus sofrimentos pela Igreja e pelo mundo”. Em 27 de dezembro de 1983, o Papa João Paulo II, foi até a prisão Rebíbia de Roma, entrou na cela de seu agressor, o jovem Mehmet Ali Agca, e o abraçou.
Não podemos esquecer das famílias judias que foram capazes de perdoar seus algozes nazistas, Historias iguais a essa se multiplicam pelo mundo afora e inadvertidamente nos levam a pensar que, de fato, oferecer perdão é um ato sobre-humano. É preciso ser uma espécie de super-humano para conseguir perdoar de verdade. E que perdão tem a ver com bondade ou superioridade. E que essas pessoas devem ser muito elevadas espiritualmente para não mais desejarem vingança ou justiça por tudo o que lhes aconteceu.
Todavia, perdoar não tem a ver como ser (ou não) bondoso; com ser (ou não) superior. Perdoar é, na realidade, uma questão de inteligência. No entanto, não como medida de proteção contra as pessoas e acontecimentos que foram “culpados” por seu sofrimento, mas por oferecer a você uma possibilidade única de conquistar uma vida mais leve, plena, saudável, feliz e bem-sucedida – pessoal e profissional.
Perdoar, diferentemente do que pode parecer à primeira vista, não é esquecer, mas deixar de se importar, mudar o foco dos seus pensamentos e ações. O perdão faz parte de um processo que, muitas vezes, é doloroso, mas extremamente necessário para a nossa libertação. É como mexer em uma ferida. Resistimos em mexer nela, em abrir e passar o remédio necessário. Mas é dessa forma que ela irá cicatrizar a não doer mais. Expor o ferimento da alma e tratá-lo, não é um ato confortável, mas crucial para que possamos alcançar a cura.
Quando perdoamos alguém, nós nos tornamos livres do passado e de mágoas que nos fazem mal. A falta de perdão desperta sentimentos pecaminosos em nosso coração contra quem fez algo contra nós. Quando perdoamos, somos livres destes pensamentos maus. Com a mente liberta, fica mais fácil nos aproximarmos de Deus e fica mais fácil também nos aproximarmos das pessoas
Estudos já demonstraram que, cada vez que nos recordamos dos acontecimentos que elegemos como imperdoáveis, nosso organismo reage quimicamente a essa lembrança como na primeira vez, aumentando a pressão arterial e os níveis de estresse. Em longo prazo, esse processo pode estar associado ao surgimento de doenças cardiovasculares, além de diabetes e câncer.
De acordo com pesquisadores da Universidade do Tennessee, nos Estados Unidos, as pessoas tendem a se sentir menos hostis, irritadas e chateadas quando param de se vingar e perdoam, o que melhora a qualidade do sono, a tensão, a raiva, a fadiga e a depressão.
É importante separar o joio do trigo. Por exemplo. Esposas que sofrem algum tipo de violência doméstica. Qualquer mulher nessa situação deve recolher imediatamente às medidas legais para garantir que não mais seja vitimada por seu parceiro. No entanto, se possível, ela deve fazê-lo não por raiva ou vingança, mas porque foi efetivamente lesada e lesionada, e tem, em seu favor, uma legislação toda concebida para protegê-la.
As vítimas de violência doméstica também podem (se assim quiserem) perdoar seus parceiros a partir da compaixão, mas que isso não significa, necessariamente, retomar a relação. O que o perdão faz é nos dar a capacidade de deixar o passado para trás. Quando perdoamos, recuperamos nosso bem-estar, nossa autoestima, nosso amor próprio e nossa satisfação pessoal independentemente de fatos e pessoas. Passamos a viver uma vida mais leve, feliz e satisfeita, mesmo com e apesar de tudo o que nos aconteceu. E, principalmente, encontramos uma paz interior duradoura e indescritível.
O perdão é uma ação que requer prática constante. Ele não acontece como num passe de mágica. É preciso praticá-lo todos os dias. Ninguém acorda um belo dia e dirá: “Agora perdoei”. Trata-se de um caminho, uma escolha que só você pode tomar para se libertar do passado e construir um presente e um futuro plenos de amor e compaixão.
Perdoar não significa esquecer ou mesmo acolher de volta aqueles que o magoaram. Significa apenas seguir em frente, sem ressentir ou se vingar pela sua dor. A dor ficou no passado e, no presente positivo que você escolheu construir, não há mais espaço para que ela ecoe!
O perdão é importante para a vida espiritual porque envolve o amor. Quem não perdoa, atrofia a sua capacidade de amar. O perdão é uma das coisas mais libertadoras que alguém pode fazer. A falta de perdão é como uma pedra amarrada na perna de alguém, que a arrasta para o fundo do mar.
Segundo o Evangelho Mateus (18:21-22), Pedro, aproximando-se, de Jesus perguntou-lhe: “Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete”.
Concluímos, reforçando que o perdão necessariamente não nos fará esquecer o que passou (não! o perdão não é Alzheimer!); apenas nos permitirá relembrar aquela história sem ressenti-la, ou seja, sem senti-la novamente.
Acredito que tudo que acontece em nossa vida sempre merece uma reflexão. Que esse artigo nos permita uma reflexão sobre o perdão e que possa ajudar a espalhar dentro de nós mesmos e entre nossos amigos, familiares, vizinhos e todos os seres humanos na Terra, o PERDÃO.