30/10/2025

Quem nunca errou que atire a primeira pedra

Acredito que a maioria das pessoas tenham escutado a expressão “Quem nunca errou que atire a primeira pedra. Por exemplo, quem nunca errou numa discussão familiar, com amigos, no trabalho, no transito, numa decisão, ou se exaltou e até julgou erroneamente o outro. Quem nunca calou para encobrir um misero erro, ou não se omitiu internamente, entre pensamentos. Quem nunca errou no amor?

Em nossa língua portuguesa, há um provérbio muito conhecido, que sofre pequenas variações a depender do local onde ele é pronunciado: “Quem tem telhado de vidro, não joga pedra no do vizinho!”. A origem dessa frase da sabedoria popular se relaciona com o desafio dirigido por Jesus aos fariseus e aos mestres da Lei no evangelho de hoje: “Quem dentre vós não tiver pecado, seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra.” (João 8,7). “Ter teto de vidro” significa que todos têm uma fragilidade pessoal ou um “calcanhar de Aquiles”.

Um autor desconhecido escreveu: “Quem nunca errou ou pecou que atire a primeira pedra. Não sou a primeiro a errar, nem a último. A vida não é feita de perfeição e sim de erros.”.

Ninguém é perfeito, somos todos perfectíveis. “Perfeito”, do latim perfectus, significa “completo”, “acabado”. Ora bem, ao contrário dos bens materiais, esses sim acabados e, eventualmente, com algum defeito, nós viemos ao mundo com particularidades e para nos irmos aperfeiçoando.

Deus considera perfeita toda pessoa que se submete a Ele plenamente, adorando-o e servindo-o de todo o coração. Logicamente, tal pessoa é perfeita na esfera finita, assim como Deus o é na esfera infinita. Sabemos que somente Deus é perfeito! Nós humanos podemos nos esforçar ao máximo, que nunca conseguiremos chegar no nível da perfeição divina.

Muitos de nós levam a vida presumindo que estão basicamente certos, basicamente o tempo todo, sobre basicamente tudo: sobre nossas convicções políticas e intelectuais, nossas crenças morais e religiosas, nossa avaliação das outras pessoas, nossas lembranças, nossas atitudes, nosso entendimento dos fatos. É como considerássemos que nossos pensamentos e ações estão sempre certos e que admitíssemos que nunca estamos errado ou de uma forma geral não cometêssemos erros.

Será que alguém sobre esse mundo de Deus possa dizer que nunca errou? Na verdade, sabemos que ninguém está imune a errar – pelo contrário, esse ato faz parte da natureza humana. Existe um ditado popular clássico que diz que “errar é humano”. Essa é uma verdade que independe de latitude, nacionalidade, etnia ou grupo socioeconômico.

Ninguém gosta de errar, mas todo mundo erra. Isto é uma peculiaridade do ser humano. Este ser tão distante da perfeição. E nós somos humanos e cometemos muitos erros. O homem é um ser falível por natureza. O erro diz respeito a uma falha estrutural da constituição humana.

O crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem se fazem muito mais através da análise de nossos erros do que pelo louvor de nossos acertos.

Como não nascemos prontos e acabados, o jogo de tentativas e erros que experimentamos desde muito cedo na vida é a base para o conhecimento de si e do mundo. Podemos até dizer que errar faz parte do processo de amadurecimento.

Quando éramos criança, estávamos fabulosamente errando, a respeito das coisas o tempo todo. Em grande parte, isso se dava porque sofríamos de um grave déficit de informações. Não apenas sobre o seu corpo, mas sobre tudo: pessoas, objetos, idioma, cultura, política, as leis que regem o mundo físico, nossa origem, a identidade de seus pais biológicos ou como (ou até que) um membro da família morreu. Aliado ao problema das informações insuficientes está o problema de más informações. As crianças acreditam em coisas como Papai Noel e a fada dos dentes, não porque sejam particularmente crédulas, mas pelas mesmas razões que o restante de nós acredita em suas crenças.

Os adultos tentam a todo custo evitar que seus filhos errem, sofram, e enfrentem dificuldades, frustrações e desilusões. Porém, é por meio do exercício desses impasses que a criança e o jovem desenvolverão recursos para perseverar diante dos obstáculos, e criarão resistência para lidar com a adversidade. Caso contrário, se sentirão despreparados para os desafios da vida e hesitarão em ter o prazer de se lançarem em novas vivências e descobertas.

Todos nos lembramos da nossa adolescência. Com certeza, não ouvir nossos pais ou os mais velhos, tenha sido um dos piores e mais comuns erros da nossa adolescência. Os pais, em sua maioria, sempre querem que seus filhos se deem bem na vida e não repitam os erros que eles cometeram. Muito de nós não ouvíamos nossos pais, mas tomávamos decisões de acordo com os nossos amigos aconselhavam ou melhor exemplificavam com atitudes.

Mil e duzentos anos antes de René Descartes ter escrito seu famoso "penso, logo existo". O filósofo e teólogo (e, eventualmente, santo) Agostinho escreveu "fallor ergo sum": erro, logo existo. Essa frase de Santo Agostinho, me fez lembrar de uma cirurgia que um amigo foi submetido de hérnia ignal. Quando o cirurgião concluiu seu trabalho, ele foi levada a uma sala de recuperação, ainda inconsciente. Ao acordar, ele olhou para si mesma, ergueu os olhos para o médico e perguntou por que o lado errado do seu corpo estava com ataduras. O médico deu uma desculpa esfarrapada. Dias depois teve que se submeter a uma nova cirurgia, agora do outro lado. Um pequeno erro médico.

Bem, no caso o final foi feliz (em tese) mas isto, na minha opinião, evidencia que mesmo profissões que tenham a finalidade de tratar da cura do nosso corpo, são propensas ao erro de diagnósticos, tratamento ou cirurgias.

Quando erramos, de qualquer modo, normalmente é típico reagirmos como não tivessem acontecido: nós os negamos, nos mantemos na defensiva em relação a eles. Temos um instinto natural em procurar justificativas, encontrar culpados, se proteger de algo que acabou cometendo, mesmo que sem intenção. Ter uma atitude defensiva é um dos piores comportamentos que podemos assumir quando erramos.

O reconhecimento de nossos erros pode ser chocante, confuso, engraçado, embaraçoso, traumático, agradável, esclarecedor e transformador da vida, às vezes para o bem e às vezes para o mal. porém, o mais importante é ser capaz de assumir o erro, aprender com ele e procurar não deixar que aconteça de novo. Reconhecer os erros também nos torna uma pessoa mais resiliente, e faz com que passemos a enfrentar os desafios da vida com alegria e disposição.

No início desse artigo afirmei que muitos de nós levamos a vida presumindo que estamos basicamente certos. Para citar apenas os exemplos mais óbvios, todo o evangelismo religioso e uma boa parte do ativismo político (especialmente ativismo arraigado) têm como premissa a convicção de que se pode mudar as crenças das pessoas. Quando outras pessoas rejeitam nossas crenças, achamos que estão erradas. Quando rejeitamos as crenças delas, achamos que nós é que possuímos bom julgamento, ou melhor estamos certos.   Os fanáticos têm em comum a absoluta convicção de que estão certos.

O que nunca podemos esquecer, que erros podem nos custar tempo e dinheiro, sabotar nossa autoconfiança e minar a confiança e estima que as demais pessoas têm por nós. Eles podem nos levar ao pronto-socorro, ou à cadeia, ou a uma vida inteira de terapia. Eles podem nos magoar e humilhar; pior, podem magoar e humilhar outras pessoas. Em suma, até o ponto em que pudermos preveni-los, é o que provavelmente devemos fazer.

O primeiro passo para aprender com os erros é tirar a imagem negativa que nos é imposta desde o começo da vida, onde errar é ruim. Claro que existem penalizações, consequências pelo erro, mas tornar essa experiência apenas algo depreciativo impede que avancemos, enxergando esse ato como um passo para o crescimento e o aprendizado.

Em nossa caminhada no “erro”, precisamos lembrar que erramos rotineiramente em relação ao amor, basta ver a estatística crescente de divórcios. Será que podemos dizer que o amor é erro, ou ao menos que tem a probabilidade de amor como sendo cego — o que significa que nos torna cegos, incapazes de perceber a verdade sobre quem escolhemos para caminhar juntos?

O amor não começa com o coração (nem aponta para o sul). Começa do pescoço para cima, com uma busca de uma comunhão de consciência.

Uma grande paixão inicial. Ao passar do namoro para caminhada do casamento, alguns casais chegam a conclusão de que sua alma gêmea foi apenas ilusão.

Na verdade, durante o encantamento amoroso há uma idealização sobre a “perfeição” dos parceiros e consequentemente das benesses da vida em comum. A partir do casamento, começam os incômodos e críticas em relação às manias, defeitos, hábitos que até então eram atenuados pela separação de casas. Muitos, quando se separam, gostam de culpar as dificuldades da vida a dois. Na verdade, deveriam se auto responsabilizar por não casarem com os “pés no mundo real” e sim fantasiarem, no próprio imaginário, uma ilusão de prazer permanente. Bem, a longevidade das relações está alicerçada nas afinidades, na lealdade e no compromisso de ambos em vencer as dificuldades.

Quando erramos de modo colossal em relação ao amor, isso se parece com algo que nunca vivenciamos. Estruturalmente, esses erros são semelhantes aos erros sobre qualquer outra crença importante.

Quer seja na vida religiosa, política, profissional, na familiar, podemos implementar um sistema para prevenir erros, mas não conseguiremos prevenir todos. Todavia, podemos criar ambientes abertos e transparentes em vez de culturas de segredo e ocultação. Cultivar a habilidade de ouvir mais e respeitar opiniões, mesmos que sejam contrárias as nossas ideologias. 

Não, não somos perfeitos. Vivemos, erramos, falhamos, tomamos direções e caminhos errados, nos decepcionamos, mas no meio disso tudo, o importante é saber que podemos corrigir, retomar, buscar, crescer e sermos melhores do que antes. Na vida é muito difícil sermos perfeitos, pelo menos sejamos  justos e façamos nossas escolhas com imparcialidade, livres e com o coração.

O único homem que nunca comete erros é aquele que nunca faz coisa alguma. Existem pessoas que simplesmente não se arriscam, essas nunca vão acertar. Aquelas que, embora também tenham medo de errar, mas se arriscam mesmo assim, têm chances de acertar.

Segundo Bill Gates todas as empresas precisam de gente que erra, que não tem medo de errar e que aprendem com o erro. Esse pensamento se encaixa em várias áreas da nossa vida.

Errar é vaguear e vaguear é a maneira como descobrimos o mundo; e, perdidos em pensamentos é também a maneira como descobrimos nós mesmos. Acertar pode ser gratificante, mas no final é estático, uma mera demonstração. Errar é difícil e humilhante e, às vezes, até perigoso, mas, ao final, é uma jornada é uma história. Todavia não podemos esquecer de colocar em nossa balança o ensinamento do matemático francês Paul Pierre Lévy, que disse:  "Nossa visão é a de que se você não reconhece que erros ocorreram, nunca eliminará a probabilidade de que voltem a ocorrer.

Sábio é o ser humano que tem coragem de ir diante do espelho da sua alma para reconhecer seus erros e fracassos e utilizá-los para plantar as mais belas sementes no terreno de sua inteligência (escritor Augusto Cury).

3 respostas para “Quem nunca errou que atire a primeira pedra”

  1. Fernando Cassimiro disse:

    Claro, Fernando! Aqui vai uma versão mais informal e próxima, como se fosse um comentário entre amigos:
    Texto TOP demais! Você conseguiu falar sobre algo tão comum — errar — de um jeito profundo e leve ao mesmo tempo. A frase “erro, logo existo” me pegou de surpresa e fez todo sentido. A gente vive tentando acertar, mas é nos erros que mora o aprendizado de verdade. Curti muito como você trouxe exemplos do dia a dia, da infância ao amor, e ainda misturou filosofia com realidade. Parabéns pela escrita clara, reflexiva e cheia de humanidade.

  2. Graça Torres disse:

    Genial meu caro amigo! Quem nunca errou és a perguntas Parabéns!

  3. Graça Torres disse:

    Genial meu caro amigo! Quem nunca errou és a pergunta . Parabéns!

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