18/02/2022

NOSSA VIDA É UM CARNAVAL

Em 1961 meus pais saíram do Rio de Janeiro e foram morar no Estado da Paraíba. Eu tinha apenas 02 (dois) anos de idade. Inicialmente fomos morar em João Pessoa mas devido a profissão do meu pai, residimos nas cidades de Umbuzeiro, Solânea e Monteiro.
Em 1971 fomos morar na cidade de Sapé. Na época, esta cidade era a maior produtora de abacaxi do Brasil. Nessa cidade passei grande parte da minha adolescência e juventude. Nesse período, vários acontecimentos foram marcantes na história de minha vida. Destaco os eventos que ocorriam no Clube Atlético Sapeense, principalmente os bailes, as festas juninas e a festa do Abacaxi. Também ocorriam nesse mesmo clube, jogos de futebol de salão. Pois bem, foi exatamente quando terminou um dos jogos que participei, que iniciei o namoro com uma jovem Sapeense que anos depois tornou-se minha esposa. Porém, não posso deixar de lembrar dos eventos carnavalescos que ocorriam na cidade de Sapé. Nessa época a cidade de Sapé se transformava em um palco de alegria. Vários blocos, durante o dia, animavam a cidade. Eu, por exemplo, fiz parte do Bloco Balança mas não cai e também do Bloco dos Inocentes. Era tradição o envio de convites para residência de amigos e também para residência dos familiares dos componentes do bloco, para que em hora marcada, o bloco visitasse e fizesse uma festa carnavalesca naquela residência. Esse evento ocorria em todos os dias do carnaval. A noite, todos participavam das festas carnavalescas dos clubes da cidade.
Anos depois, já morando em Natal-RN, conversando com o amigo Roberto Rabelo, descobri que por volta dos anos 60, 70, ou até antes disso, esses eventos também faziam parte do período de carnaval de Natal, apenas tinham a denominação de “assaltos de carnaval”.
Bem, deixando as minhas histórias de lado, lembramos que o Brasil em 2021 vivenciou algo inédito. Em decorrência da pandemia de covid-19, as festividades de Carnaval foram canceladas em todos os estados brasileiros.
Desde que os festejos carnavalescos começaram por aqui, eles nunca deixaram de ser celebrados no período que antecede a Quaresma, em fevereiro ou no começo de março.
Este fato derrubou uma citação do escritor Graciliano Ramos que disse: “Se a única coisa que o homem terá certeza é a morte; a única certeza do brasileiro é o carnaval no próximo ano”.
Importante lembrar, que as tentativas de cancelamento ou adiamento do Carnaval ocorreram duas vezes na história do Brasil, porém a população não acatou a mudança e comemorou a festa nas duas datas: a oficial e a nova que havia sido determinada.
A primeira ocorreu também por questões sanitárias, em 1892, quando o país lidava com uma série de doenças, como a febre-amarela. O ministro do interior decidiu mudar a data para 26 de junho. Para o ministro, junho era um mês “mais saudável” do que fevereiro. Porém, não foi respeitado pelos foliões e houve comemoração nas duas datas de Carnaval, um carnaval em fevereiro e outro em junho.
A segunda tentativa de adiamento da festa popular foi em 1912, devido à morte do Barão do Rio Branco, então ministro do Exterior e tido como herói nacional. Ele faleceu uma semana antes das festas. O governo decretou o adiamento do Carnaval para 6 de abril, dois meses depois da data oficial. Em princípio, parecia algo sensato, mas quando chegou o sábado de carnaval, o povo foi para a rua afogar as mágoas e acabou o luto. Mais uma
vez ocorreram dois carnavais no Brasil, em fevereiro e abril. Os registros históricos trazem até uma marchinha que o povo cantava na rua dizendo que, “se o barão morreu e a gente teve duas festas, imagina quando morrer o general”.
As duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945) também não impediram a realização do carnaval no Brasil, a despeito de tentativas das autoridades.
Além do fim da Primeira Guerra, 1918 ficou marcado pela gripe espanhola. É fácil presumir que, diante da tragédia, o carnaval não fosse realizado. Mas aconteceu exatamente o contrário. A festa de 1919 é tida, até hoje, como a maior de todos os tempos.
Interessante que o Carnaval não é uma invenção brasileira. Não se sabe exatamente como o Carnaval surgiu. Segundo alguns historiadores, sua origem remonta à Antiguidade.
O Carnaval é uma tradicional festa popular realizada em diferentes locais do mundo, sendo a mais celebrada no Brasil.
A palavra Carnaval é originária do latim, carnis levale, cujo significado é “retirar a carne”. Esse sentido está relacionado ao jejum que deveria ser realizado durante a Quaresma e também ao controle dos prazeres mundanos. Isso demonstra uma tentativa da Igreja Católica de controlar os desejos dos fiéis.
O Carnaval brasileiro começou com o entrudo, festa popular trazida pelos portugueses por volta do século XVII, onde, no passado, as pessoas jogavam uma nas outras, água, ovos e farinha. Também foi influenciado pelas festas carnavalescas que aconteciam na Europa. O entrudo manifestou-se no período do Brasil colônia e também no Império. Em Recife existe até hoje. Nesta festa, os foliões jogavam uns nos outros água, ovos, farinha, pós de vários tipos, como o cal, etc. Como as comemorações fossem ficando cada vez mais violentas, o entrudo acabou sendo proibido. O entrudo acontecia num período anterior a quaresma e, portanto, tinha um significado ligado à liberdade. Este sentido permanece até os dias de hoje.

Entrudo


Em países como Itália e França, o carnaval ocorria em formas de desfiles urbanos, onde os carnavalescos usavam máscaras e fantasias.
No Brasil, no final do século XIX, começaram a aparecer os primeiros blocos carnavalescos, cordões e os famosos “corsos”. Estes últimos, tornaram-se populares no começo dos séculos XX. As pessoas se fantasiavam, decoravam seus carros e, em grupos, desfilavam pelas ruas das cidades. Está aí a origem dos carros alegóricos, típicos das escolas de samba atuais. Composta em 1899, a marchinha “Ó Abre Alas” de Chiquinha Gonzaga foi a primeira música feita exclusivamente para uma agremiação carnavalesca.
O carnaval é uma festa que traz um grande sentido de liberdade, uma vez que permite às pessoas reencontrarem suas raízes ancestrais. O fato de se fantasiar nessa ocasião torna a experiência ainda mais interessante. Fantasias são sempre simbólicas e, por isso, dão condições para que as pessoas se expressem através delas, realizando um sonho, se
apresentando como a personagem de um tempo perdido na história, prontas para desempenhar papéis muito distantes de sua realidade existencial. A escolha de uma determinada fantasia desvenda a personalidade e até a intimidade dos indivíduos. Vejamos por exemplo a fantasia de palhaço. Revela alguém que gosta de agradar os demais, muito sociável e extrovertido, acredita que sempre há um jeito de melhorar as dificuldades. Solidário, se identifica com as preocupações dos amigos, gosta de ajudar a quem necessita.
Enquanto parte dos brasileiros ama se fantasiar, sambar e curtir a festa, muitos fazem de tudo para fugir do agito. Quem não gosta de carnaval aproveita o momento para ficar em casa, visitar parentes ou acampar.
Culturalmente o carnaval é percebido como uma festa onde tudo pode. É justamente esse tipo de pensamento presente no carnaval que faz com que muitos romances carnavalescos não continuem quando a festa acaba. Tem pessoas que terminam seu namoro apenas para ficarem livre no carnaval e, depois dos cinco dias de festa, procurarem a ex (ou o ex) para voltar. É claro que existe gente que faz isso e se comporta de maneira descompromissada o ano inteiro, mas durante o carnaval as chances de isso acontecer parecem ser maiores. Estes tipos de situações podem trazer muita decepção para quem criou expectativas de que o relacionamento possa continuar depois da folia.
Quando o Carnaval se aproxima, é hora de se lembrar das boas e velhas marchinhas. As músicas de Carnaval que nunca saem de moda. Algumas delas foram escritas há mais de 100 anos e mesmo assim, elas continuam sendo cantadas pelas novas gerações com o mesmo frescor de antigamente.
Lembrando das emoções no período de carnaval, podemos cantar: “Quanto riso, oh, quanta alegria! Mais de mil palhaços no salão. Arlequim está chorando. Pelo amor da Colombina. No meio da multidão”. Mas não só choram os Arlequins, os Pierrôs também: “Um pierrô apaixonado, que vivia só cantando. Por causa de uma colombina, acabou
chorando, acabou chorando”. Nesse momento vem à lembrança de alguém: “Mamãe, eu quero, mamãe, eu quero. Mamãe, eu quero mamar”. Porém, outros afogam as mágoas de outras formas: ”As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar. Eu passo a mão na saca-saca-saca rolha. E bebo até me afogar”. Desesperadamente alguém diz:
“Taí, eu fiz tudo pra você gostar de mim. Oh! meu bem, não faz assim comigo não. Você tem, você tem que me dar seu coração”. Mas, talvez o problema tenha sido outro: “Se você fosse sincera. Ô, ô, ô, ô, Aurora”. Também existem os liberais ou sabidos: “Este ano não vai ser igual àquele que passou. Eu não brinquei, você também não brincou. Aquela
fantasia que eu comprei, ficou guardada e a sua também, ficou pendurada. Este ano tá combinado, nós vamos brincar separados”. Para diminuir a culpa, sempre tem uma palavra de conforto: "Vem Jardineira, vem meu amor. Não fique triste que este mundo é todo teu. Tu és muito mais bonita que a Camélia que morreu”. Mas, a festa está terminando e
alguém diz: “Ai, ai, ai, ai. Está chegando a hora. O dia já vem raiando meu bem, eu tenho que ir embora”. E ainda complementa: “Moro, em Jaçana. Se eu perder esse trem, que saia agora às onze horas. Só amanhã de manhã”. Quem fica só pode cantar: “Quem parte leva saudade de alguém, que fica chorando de dor. Por isso não quero lembrar, quando partiu, meu grande amor”.
Resumido as emoções do carnaval podemos dizer: “A nossa vida é um carnaval. A gente brinca escondendo a dor. E a fantasia do meu ideal. É você, meu amor”.
Uma observação interessante foi feita por um fotógrafo chamado Adilson Santos: “Quando o carnaval acaba, muitos políticos continuam com suas máscaras”.
Enfim, existem os que amam e os que odeiam Carnaval. De que lado você está? Se dos que amam. Bora pular Carnaval porém não esqueçam: “Se beber não dirija”.

21 respostas para “NOSSA VIDA É UM CARNAVAL”

  1. JOÃO WILSON DE LUNA FREIRE disse:

    Eita Zé! Voltei aos tempos dos saudosos carnavais de SAPÉ:=
    “É TONGA! É TONGA! É TONGA QUE NÃO TEM RIVAL.
    CHEGOU PRÁ ANIMAR A TURMA, CHEGOU PRÁ ANIMAR O CARNAVAL. (BIS).
    Saudades dos bailes carnavalescos do CLUBE ATLÉTICO, e Saudades dos componentes da TONGA, que já subiram para o próximo andar.
    Mas é vida que segue! Quem sabem se não fundaram uma TONGA II no JARDIM DO ÉDEN?
    FELIZ CARNAVAL!!!
    💃🕺💃🕺💃🕺🍺🍺🍺🍻🍻🍻🥃🥃🥃🎹🎹🎹🎷🎷🎷🎺🎺🎺🎤🥁🥁

  2. Claudio disse:

    Mais um texto de ótimo nível.
    Parabéns Viana

  3. Zé Beto , Sapeense disse:

    Valeu brother ficou top o artigo,Parabéns e viva Sapé de onde sou natural!

  4. Eliasfqueiroz disse:

    Parabéns meu irmão! Você é nota 10
    Um TFA

  5. Marcelo Raposo disse:

    Texto gostoso de se ler.

  6. Ivonilde Melo de Lima disse:

    Meu sobrinho como sempre, vc arrasa em seus textos. Amei voltar no túnel do tempo com todos os detalhes dessa festa maravilhosa que é o carnaval, e ainda ficar sabendo um pouco o que guardam os historiadores. Brinquei muitos carnavais quando solteira ao som dessas musiquinhas deliciosas que ficarão para sempre em nossos corações. Parabens!!! Bjss da tia.

  7. Azinete disse:

    Valeu meu compadre!!! Maravilhoso , este texto. Que bom relembrar as marchinhas de carnaval , o carnaval em Sapé…

  8. Marcus Soares disse:

    Adorava o corso, as músicas da época…se a canoa não virar olé, olé olá eu chego lá… a inocência daquele tempo e o molha molha, até lança perfume era permitido e todo mundo pedia um trago da Rodoro. Um banho de recordações. Continue nos brindando com estas pérolas. Se você pensa que cachaça é água, cachaça não é água não………..

  9. Rosa Honório disse:

    Quanta saudade, lembranças q nunca serão apagadas,como fomos felizes, éramos uma grande família onde todos se conheciam. Adorei ler e passou um filme! Os Trapalhões meu bloco do coração, quardo com zelo todas as lembranças, amo o carnaval! Parabénsss!!!

  10. Aldenor disse:

    Relembrei meus tempos de carnaval de rua no interior de Pernambuco. Maravilhoso!!!!

  11. WASHINGTON disse:

    Parabéns Viana . Mais uma maravilha de texto . Viagem total pelo carnaval e músicas . Viajei bem longe nos anos de belos carnavais . Maravilha

  12. Fernanda disse:

    🎉👍🏻 excelente texto 🥰🥰🥰

  13. Deuslene disse:

    O carnaval não pode deixar de existir porque é depois dele que o ano começa! 😃😃

  14. Vera Lucia Araújo de Oliveira disse:

    Seu texto, faz lembrar nossa juventude na qual fizemos parte dos blocos, assaltos e à noite íamos aos bailes nos clubes , tudo muito leve. Realmente, as marchinhas é o ápice do Carnaval. Parabéns meu compadre, relembrar de momentos tão alegres, em companhia de você e Mazé .

  15. Thiago alves disse:

    Excelente artigo, principalmente pq vemos q a politica se encaixa nas marchinhas de carnaval. 👏👏👏👏

  16. Fred Maia disse:

    Blz, mestre Viana!!

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